Procuradoria apresentou parecer em ação de três partidos na Corte. Para as siglas, a regra viola princípios constitucionais de dignidade da pessoa humana, democracia e cidadania. A Procuradoria-Geral da República defendeu, nesta sexta-feira (6), que o Supremo Federal anule uma lei do estado de São Paulo que deu o nome de Antonio Erasmo Dias a um viaduto no interior do estado.
Coronel da reserva do Exército, Dias atuou como secretário de Segurança Pública no período da Ditadura Militar. Foi responsável pelo cerco ao campus da Pontifícia Universidade Católica, em 1977.
Segundo a PGR, "qualquer ato estatal que, de forma explícita ou velada, enalteça o autoritarismo é contrário à própria gênese do regime democrático e merece o mais veemente repúdio".
A PGR apresentou parecer assinado pela procuradora-geral Elizeta Ramos em uma ação que questiona a norma, apresentada por três partidos e o Centro Acadêmico 22 de agosto, ligado à PUC-SP.
Apesar de considerar que o tipo de ação apresentado ao Supremo não é a via processual adequada para discutir a questão, a Procuradoria concluiu que, no mérito (analisando o conteúdo), o pedido dos autores deve ser atendido.
"Refoge do campo da discricionariedade política lei ou ato normativo que, direta ou indiretamente, atente frontalmente contra o valor da democracia ao enaltecer, mesmo que simbolicamente, o regime totalitário", declarou.
"Sem desmerecer os méritos de Antônio Erasmo Dias, enquanto militar do Exército Brasileiro e Parlamentar, é incontrastável que a trajetória de vida da personalidade homenageada com a designação de seu nome a via pública, historicamente ligada a atos antidemocráticos praticados na vigência da ditadura militar no Brasil, significa perenizar a memória de momento tormentoso da história brasileira e, em consequência disso, enaltecer, mesmo que de forma simbólica, o autoritarismo. E democracia não convive com autoritarismo!", afirmou a procuradora-geral no documento.
Entidades criticam homenagem em viaduto a coronel da Ditadura Militar que invadiu a PUC-SP em 1977
Histórico
A lei foi sancionada pelo vice-governador do estado, Felício Ramuth (PSD).
Na sequência, PT, PSOL e PDT acionaram a Corte, pedindo a invalidação da norma. Para as siglas, a regra viola princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da democracia e da cidadania, além da dignidade de vítimas do período.
"Ao homenagear Antonio Erasmo Dias, um dos mais emblemáticos agentes das violações aos direitos fundamentais perpetradas durante a ditadura militar, a Lei paulista prestigia as investidas das novas formas de autoritarismo, pois inocula no sistema de Direito positivo estadual atos de glorificação e de legitimação da ditadura militar que, por duas décadas, assolou o Brasil (1964 a 1985), em afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da democracia, da cidadania, que não só asseguram o direito à memória histórica e à verdade, como também resguardam a dignidade das vítimas", afirmam.
"Não se trata de mera homenagem isoladamente considerada, mas de ato dotado de propósitos marcadamente sistêmicos de degradação e fragilização tanto do próprio pacto civilizatório quanto dos preceitos fundamentais da Constituição Federal. Mantendo-se incólume o ato normativo, viola-se o compromisso irrenunciável estabelecido pela Constituição para com os valores democráticos, os direitos fundamentais à memória histórica e à verdade, e a dignidade das vítimas", completam.
AGU
Em setembro, a Advocacia-Geral da União já tinha defendido que o STF invalide a norma, por considerar que atos de homenagens na denominação de bens públicos devem ser compatíveis com os princípios estabelecidos na Constituição Federal - especialmente a a promoção e a defesa do Estado Democrático de Direito.
O caso está sob análise da ministra Cármen Lúcia, relatora da ação.